3.10.06

A um sujeito acima da média


Ou onde a mediocridade não assenta

Entre tantas bobagens postadas nesse blog por essas mãos que vos escrevem, deixo aqui uma homenagem a um cara muito acima da média. Ele não era um sujeito ordinário, desses que se convencem com qualquer retórica. Era um cara brilhante, com uma fé inabalável nesse país. Um batalhador que cresceu órfão dos pais, mas acompanhado por outro homem incrível, seu Otacílio, em uma pequena cidade no extremo sul do litoral brasileiro. Uma cidadezinha pacata, chamada Mostardas (foto da estrada para lá ao lado/crédito Helena Beatriz), entre a Lagoa dos Patos e o mar.
Muito aplicado, esse sujeito saiu de uma vida muito modesta com disciplina e sonho, tornando-se aviador e, depois, engenheiro do ITA. Nas suas andanças de militar e piloto da FAB, viveu muitos lugares e céus, ensinou muita gente como professor, pai e avô. Ficou viúvo de uma jovem bela e encontrou de novo o amor nos olhos claros de Beatriz.
Astuto, bravo, dedicado, lutou para tornar o Brasil um país melhor. Chegou a render-se, no fim da vida, a esperança da esquerda que brigava por novas perspectivas, simbolizada pelo Partido dos Trabalhadores.
Leitor voraz, excelente contador de histórias, esse sujeito preparava o melhor chimarrão do hemisfério sul. Soube, como poucos, incentivar a inteligência de quem estava a seu lado. Acreditava na soberania nacional, na força do brasileiro e em teorias mirabolantes. Gostava de um banho de mar e, como bom estrategista, jogava cartas como ninguém. Com sua voz grossa, assustava os alunos indisciplinados nas difíceis matérias de Engenharia e entoava as melhores canções de Ano-Novo ao sabor do ponche.
Esse cara, muito incrível, chamava-se Octávio Barbosa da Silva. Por força do destino e ensurdecido pelas turbinas dos aviões que pilotou, sofreu um derrame em uma tarde de Natal, entre filhos e netos. Veio a falacer no feriado nacional, 15 de novembro, marco da República. Esse sujeito, que me ensinou a gostar de política, que leu comigo a biografia de Getúlio, com comentários telefônicos quase diários, que muito se orgulhou de minha decisão de cursar Ciências Sociais na USP, que localizou todas as constelações possíveis para mim, esse sujeito era o meu avô. Pai de minha mãe, que aprendeu com ele a ser muito brava, muito ética e dedicada e ensinou tudo isso a mim. Porque alguns valores, ainda que desgastados na contemporaneidade, passam através das gerações. Certamente não ficamos ricos, mas dormimos em paz em nossos travesseiros, sabendo que fizemos o melhor que podíamos.
Essa homenagem é a esse cara, seu Octávio, vô Tavico para mim, meus irmãos e primos.
Para saber mais de onde vieram os genes dessas mãos, acesse: www.infra.ita.br/apresentacao/historico.php
Não é qualquer um que tem um avô assim.